diz que não é nada. Ecoam vibrações
nos meus pulsos, linhas trocadas no pescoço.
Só pode ser por tua causa, ser desconhecido.
Que me invades carro, casa e coração.
Comboio, táxi, local de trabalho.
Quarto, sala, cozinha, televisão.
Reconheço a penumbra desta garagem
onde vens pôr o carro diariamente.
Marquei as tuas horas na minha memória
e quando à hora certa sinto o barulho
do teu escape atrapalham-se-me as mãos
nas chaves e desengato do porta-chaves
o emblema do carro. Tanto nervosismo
é real? Bom dia, digo, e são já dezanove
e quarenta e cinco, um quarto para as oito.
O teu cansaço é real. Pões agora numa casa
ritmos fáceis, não obedecem a qualquer
contradição, fazem-se porque têm
de se fazer, se tu não os fizeres
quem os fará? Somos dois burros
a lutar cabeça com cabeça, as malhas
do amor enredaram-nos de tal forma
que nos parece tragédia ter um corpo.
Ainda assim te espero como se fosses
um ser desconhecido, para quem eu
preparasse um jantar especial. E repito
a velha imagem de filmes, peças
de teatro, vida real, mostrando o tempo
a passar e a mesa posta para dois.
Vai começar a terceira série do Prison
Break, aproveito a publicidade
institucional para abrir a garrafa,
fatiar a carne. Acendo a vela e ponho
o guardanapo nos joelhos, estou só,
ninguém veio, Quincy Jones tocou
este tempo todo, acompanhado
por uma grande orquestra cheia de estrelas.
Helder Moura Pereira
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