Meu vistoso teatro de fantoches...
Corpos exaustos como velhos coches,
Mas que trazem a alma a fio de prumo...
Mesas onde a minha alma se baloiça...
Trottoirs dos meus dedos vagabundos...
Canais compridos, largos e profundos,
Onde os pires são gôndolas de loiça...
Sorrisos de Satan pelas bandejas...
As gabardines verdes são lagartas!
Certas brancuras lembram as igrejas:
Guardanapos, jornais, papel de cartas...
Dos creados de mesa é que se fazem,
Sem dúvida, os melhores malabaristas;
É na ponta da unha que eles trazem
Facas e copos, galheteiros, listas...
Uma orquestra de vozes irreais
Entre rolos de fumo se levanta:
A rapsódia em lá: cordas vocais...
Tziganos vermelhos na garganta!...
Entram mulheres: trazem, em seus vestidos,
As estátuas, eléctricos, o Sol...
Hirto como o soldado no Verol,
Sou o Napoleão dos meus sentidos...
Nuevo Mundo, La Esfera, Illustration,
Uma revista semanal inglesa...
A Vogue, a Femina e o Fon-Fon
São amostras do mundo pela mesa...
Hotel de pernoitar para os artistas...
Vejo em trajes menores o pensamento...
Poetas, pinta-monos, jornalistas...
Com nódoas de café pelo talento...
E, finalmente, este poema franco,
Este poema sem nenhum enfeite,
Em tinta negra sobre o papel branco,
É uma taça de café com leite...
António Ferro
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