segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Levanto-me e vou à janela.
Gotículas de água agarradas aos vidros.
Em baixo
sem o calor das folhas ou a alegria das flores
as árvores tiritam de frio.

As árvores, digo comigo?
Como as árvores?

Fico de repente espantado
com o facto de existirem árvores
mesmo que sejam árvores nuas
árvores pobres e municipais.
Nunca da sua existência me apercebera.
Nunca me dera conta que existissem.
Não fazia a mais pequena ideia que existissem árvores.
É espantoso saber que existem árvores
e mais espantoso ainda
que árvores aqui existam.
Aqui nestas traseiras
onde nunca nada houve.
E é espantoso que eu possa vê-las
como agora as estou a ver.

E ver que as vejo
deve ser ainda mais que tocá-las.
Vincam-se lívidas na névoa que clareia.

Erguem-se os braços nus e suados no ar.
Existem, Deus meu.
E com elas
passam a existir todos os quintais das traseiras.
E com os quintais
passam ainda a existir
os torreões brancos da Igreja de S. Vicente
e por detrás o Tejo.

Mas como o Tejo?
Como o Tejo
se nunca o vi em criança
que é a idade justa para haver Tejo?

E para cúmulo
ao fundo
tudo isto coroando em excelência
a linha solene e altiva
sem nada perder em doce
da Arrábida.

António Cândido Franco

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