segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

(VERSOS A UMA CABRINHA QUE EU TIVE)

Com seu focinho húmido
Esta cabrinha colhe
Qualquer sinal de noite
De que a erva se molhe.

Daquela flor pendente
Pra que seu passo apela
Parece que a semente
É o badalinho dela.

Sua pelerina escura
Vela-a da noite sentida;
Tem cada pêlo uma gota,
Com passos, poeira, vida.

De silêncio, silvas, fome,
Compõe nos úberes cheios
Toda a razão do seu nome
E fruto de seus passeios.

Assim já marcha grave
Como os navios entrando,
Pesada dos pensamentos
Da sua vida suave.

E enfim, no puro penedo
De seus casquinhos tocado,
Está como o ovo e a ave:
Grande segredo
Equilibrado.

Vitorino Nemésio

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